segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

RIDING THE HORSE - parte 2

Minha passagem foi um drama à parte. Estava com muito medo de não conseguir o visto pra viajar, porque não tenho absolutamente nada que comprove um vínculo com o Brasil, e não acreditava que o doutorado pudesse ser considerado pela embaixada australiana como comprovação de que eu não iria ficar ilegal no país pra ser, sei lá, prostituta e/ou escrava branca. Então fiquei esperando a resposta deles.

O problema é que eu tinha pouco tempo pra comprar a passagem com o super desconto de estudante, e, quando o visto finalmente chegou, um mês depois, já era, tive que me contentar com o valor total. E, como o visto tem um prazo de validade, e aparentemente todos os brasileiros resolveram viajar pra Austrália nesse período de fim de ano, o primeiro lugar disponível que apareceu foi pro final de janeiro, o que significava esperar quase 3 meses pra entrar no avião (já no limite de expirar meu visto).

Isso significou vir pela Aerolineas Argentinas, e eu queria vir pela Lan Chile (um monte de gente botou terror na empresa hermana). Mas tudo nessa viagem aconteceu pro melhor: não consegui viajar antes do fim do ano, o que significou chegar aqui numa temperatura mais amena (no auge do verão os dias batem 40 graus!), e ganhei de presente a segunda parte da viagem na classe executiva. Não sei exatamente o porque disso ter rolado comigo, já que eu nunca ganhei nem bala na feira, mas, como diria o Chicó, só sei que foi assim que aconteceu.

E, presente dos presentes, a Aerolineas não tem 3 classes, mas duas. Ou seja, viajei na executiva que equivalia à primeira classe. Nem gosto de ficar falando nisso mais, porque a cortesia não vai se estender pra volta - vou ter que retornar junto com a gentalha do mobral na classe econômica. Isso é de uma tremenda de uma sacanagem! É mais ou menos o que senti quando vi uma carteira rosa vintage da Chanel numa revista e me apaixonei, mesmo sabendo que jamais teria 5 mil dólares pra dar naquela bolsa. Ou em qualquer outra.

Mas enfim. O que segue agora é o relato dessa segunda parte da viagem, assim que peguei o segundo avião na Argentina, em direção a Auckland, na Nova Zelândia.

...

Pra começar, esqueçam essa história de que o importante é viajar. Quem diz isso nunca sentiu o gostinho dos mimos da primeira classe - a única classe, se vocês querem saber. Sim, ser pobre é uma merda. Eu sou metida, e nunca escondi isso, e só me arrependo de nunca ter viajado antes, porque ter know how teria feito muita diferença nessa hora.

Sim. Minha cara de perdida era óbvia, por mais que eu tentasse esconder que era peixe fora d'água - e me refiro não apenas ao fato de estar viajando pela primeira vez, mas de estar viajando de primeira classe. Escondi minha ignorância de todo jeito, mas se teve alguém que eu não consegui enganar, esse alguém foi o Bigode. Explico.

Primeiramente, na entrada do avião, assim que as aeromoças viram 7A escrito na passagem o sorriso delas mudou. O tratamento diferenciado já começava ali. Me levaram até meu lugar, e um comissário veio com uma bandeja: água, suco de laranja, champagne. Na econômica só tinha refrigerante pet - só pra vocês terem um elemento de comparação, ok. Esse mesmo comissário, um coroa de longos bigodes negros, tinha me visto entrar na parte nobre com minha malinha xadrez. Nossos olhares se cruzaram. E eu soube. Eu soube que ele soube.

Eu soube que ele soube que eu não pertencia àquele lugar, viu. Que eu era haoli. Que eu era ralé. Que eu era parte do mobral, e tinha era que estar lá no rabo do avião, não esparramada ali naquele assento gigantesco, sendo servida do bão e do miór. Ele sabia. Hermano feiticeiro do cacete.

Só que, mesmo sabendo, ele tinha que fazer o trabalho dele, néam. E veio pra perto de mim com uma bandejinha cheia de canapés de queijo gruyère e tomate seco. Fiquei com medo de tomar champanhe e pagar mico, muita gente disse pra eu tomar cuidado com álcool, então fiquei só na água mesmo. E dali foi só esperar todo mundo se acomodar pra chegar na minha parte preferida da viagem: a decolagem. Sorri só de pensar que ainda teria outra parada, logo outra oportunidade de sentir o avião pegando velocidade e subindo. Claro que, dessa vez, o avião era bem maior, e a impressão que eu tive foi que ele não ia subir não. Mas subiu, é claro, afinal o que é que eu sei?

Eu só sei é de uma coisa: I was born to first class. Vou até fazer uma camiseta. Ou uma tatoo.

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Naquela parte da viagem, tiva a companhia de um ser humano que deveria descrever como uma mistura de Paul Hogan, Kelly Slater e David Beckham. Mas meninas, não se assanhem ainda; em relação ao visual, ele tinha jeitão de surfista metrossexual, mas a cara tava mais pra Paul Hogan mesmo.



O fato é que o homem chegou, deu aquele sorrisinho, arrumou as coisas, bebeu champagne, e começou a ler um livro. Pouco depois, percebi que ele tava de olho no meu caderninho de anotações, onde estava tomando notas pro blog. Ele olhou pro caderno rosa, pra caneta rosa, pra valise rosa, e não conseguiu segurar o riso quando viu minhas meias cor-de-rosa com desenho de joaninha. Bom, ok, talvez eu tenha mesmo exagerado. Ainda bem que não dava pra ele ver minha luva de lã rosa. Com pompons. A questão é que eu já tinha perdido a credibilidade mesmo, néam, então pra que me preocupar.

...

Sabem de uma coisa horrível? Eu sempre falava em português com as pessoas. Olhando pra trás, acho que era por isso que eles não entendiam nada do que eu estava falando. O Paul Hogan tentou puxar papo comigo, mas acho que ele logo percebeu que ia dar muito trabalho e desistiu. Ou isso, ou foi quando eu disse que era professora depois dele ter dito que tinha feito especialização em Business pela UCLA. Tipos, eu sequer valia a pena. Mas ele bem foi bonzinho, e nem riu quando eu pedi pra ele chamar o fly attendant.

A viagem de 14 horas até Auckland foi tranqüila, apesar de entediante. Uma escuridão danada do lado de fora, e horas e mais horas atravessando o Pacífico sem nada pra fazer... O jantar foi chato, porque Bigode nunca entendia o que eu tava falando (português versus espanhol + minha voz naturalmente muito baixa + barulho do avião + o fato dele ser um besta). Eu quis o macarrão e ele me deu a carne, pedi vinho branco e ele queria me servir tinto, desisti de tentar pedir a sobremesa, já que ele não ia me dar o que eu queria mesmo, fiz que não com a cabeça quando ele apareceu com o carrinho, e quase morri quando descobri que era sorvete.

Paguei mico quando fui ao banheiro pela primeira vez. Tipo, eu lá sabia como era banheiro de avião? E cadê que eu encontrava a porta? Fiquei rondando por ali, fingindo que tava esticando as pernas com exercícios de alongamento, até que resolvi voltar pra cadeira. Aí vi uma porta onde tava escrito toilet, bem apagado. Ela abria esquisito, mas consegui entrar e fazer meu xixi, que tava quase saindo pelo meu nariz.

Cochilei um pouco. Acordei. Não sabia acender a luz, nem ligar a televisão, e pra falar a verdade não queria dar a Bigode o prazer de ter certeza de que eu não sabia mexer em nada daquilo. Coloquei minha máscara de panda da Denize, e esperei o tempo passar. E quanto tempo. Gente. Quanto. Tempo. Tanto tempo que cada turbulência era um deleite.

Aí, depois que serviram o café (com um espeto de carne e cebola, e um quadrado verde molhado que parecia pão mofado e que permaneceu, obviamente, intocado na bandeja), eu sabia que faltava pouco pra aterrissar. Saí do avião com medinho de passar pela alfândega (o Erick cansou de ver gente levando esporro ali), e segui pra terceira parte da viagem. Já conto.

10 comentários:

Wans disse...

Olha, xixi saindo pelo nariz foi fooda!
Aninha, vc não vai deixar de ir visitar a Nova Zelândia, né? Vc precisa ver os Hobbits e Elfos e a Terra Média e depois me conta, hein?

bjs

Renata disse...

ahhh, eu viajei na noite de ano novo, que é muito mais barato, né?

e vim por uma empresa espanhola. dei sorte de elestb serem supersticiosos e ganhei champanhe e uva assim que sentei no meu lugar!

minha conexâo era pela air france, entâo cheguei em solo francês fingindo que sou chique...

Jackie Götzen disse...

Ixi...já viajei sozinha pra Salvador..é é muito engra~çado a gente fingir que sabe o que tá fazendo...

Olha...acho que vc já tem um 1º capitulo de um livro!!!

Ana disse...

Wans, vi muito pouquinho de cima, e do aeroporto dava pra ver uma floresta. A primeira coisa que eu pensei foi em Fangorn!!! Eu fiquei ali sorrindo que nem boba, com minha curiosidade de ringer. Eu queria demais fazer um tour LOTR por la', mas e' cari'ssimo, infelizmente. Estou vendo aqui quanto custaria ficar uns 4 dias em Wellington, pelo menos, mas so' a passagem e' uns 600 e poucos do'lares. Eu poderia mudar minha data de volta e ficar uns dias em Auckland, mas ai' teria que pagar 200 do'lares pra Aerolineas... enfim, espero que de pra eu ir. Se nao der, a gente come,ca a juntar dinheiro pra ir, no's dois, ok?? :)

Renata, eu tava morrendo de calor, mas nao tirei meu trench e meu o'culos chanel por nada. Cheguei que nem uma celeb. Quando cheguei na recep,cao, uns meninos ficaram olhando pra mim! rs Me senti. (ps: bom, espero que nao tenham pensado em mim como uma celeb em fim de carreira). E o sonho da minha vida e' a Air France, che'rie.

Jackie, vc comprari esse livro? rs

Renata disse...

Ana, como o tempo passa rápido! parece que eu fiquei um só dia sem te visitar e olha só quanto eu já perdi!

Eu juro que seu blog será meu 'survival guide' pra qdo eu viajar de avião a primeira vez...juro...

Ana disse...

Re, e' q so' agora eu to comecando a me organizar, tem um monte de coisa pra eu contar!

E no dia q vc for viajar, pode contar comigo pra qquer coisa. Nao me considero expert, claro, mas e' muito bom poder contar com algue'm pra tirar nossas du'vidas, quando a gente se sente nervosa com a primeira vez!

Renata disse...

Eu jamais dispensaria o champagne, Ana! rs

Ana disse...

nem correndo o risco de ficar mutcho lôca????

Gileade disse...

Querida, quando você for uma escritora famosa, você vai olhar o Bigode de cima!

Ana disse...

Já pensou? Exigir a presença dele no meu vôo? Que diva!